Pesquisadora Cristiana Toscano tem mais de 20 anos de trabalho na área de serviços de saúde e carreira internacional (Foto: Pedro Toscano Soares)

Infectologista e epidemiologista Cristiana Toscano, é a única brasileira convidada pela Organização Mundial da Saúde (OMS) para compor grupo que analisará buscas por imunização...

Única brasileira convidada pela Organização Mundial da Saúde (OMS) para participar dos estudos de vacinas contra a doença causada pelo novo coronavírus (Covid-19), a médica infectologista e epidemiologista Cristiana Toscano, da Universidade Federal de Goiás (UFG), falou com o portal sobre as perspectivas dos pesquisadores de encontrar a fórmula que será capaz de imunizar a população contra o Sars-CoV-2, vírus causador da pandemia que praticamente parou o mundo. Apesar de afirmar que existem inúmeras “vacinas candidatas”, a cientista destaca que ainda há muitas etapas a ser vencidas. As expectativas são positivas para o “sucesso da empreitada há médio prazo”, com uma vacina “talvez até o final do ano, início do ano que vem”. Paulista de nascimento, Cristiana, que se casou com um goiano após trabalhar em diversas partes do mundo, se diz “goiana de coração”. “Adotei Goiás”, brinca sobre o Estado que ela tem ajudado a monitorar os números de casos e fazer prognósticos. Confira abaixo os principais trechos da entrevista.

Como foi o convite?

Eu recebi o convite há uma semana, através de um e-mail do secretariado desse comitê internacional da OMS perguntando se eu tinha interesse em participar desse grupo. Eu fiquei bastante lisonjeada e muito feliz. Ontem (quarta-feira, 27) eu recebi uma formalização da minha indicação e do convite que eu prontamente aceitei. Foi muito emocionante.

A quê você atribui o convite?

Eu trabalho na área de vacinas há quase 20 anos. Moro em Goiânia há 10 anos, mas eu tive uma carreira de saúde pública internacional, focada na área em doenças imunopreviníveis e vacinas. Trabalhei em vários países, com investigação de surtos no Haiti, em outros países da América Latina e da África. Depois trabalhei com a Organização Panamericana da Saúde no Brasil, na sede em Brasília, e depois e Washington. Depois de alguns anos, trabalhei na OMS em Genebra (Suíça). Eu era responsável por coordenar a rede de vigilância de notificação de casos de doenças preveníveis por novas vacinas. Acho que por esse histórico. A gente tem um grupo internacional de pesquisadores e instituições que trabalham na área que a gente se comunica bastante, tem um relacionamento técnico e científico bastante forte, e eu imagino que por isso tenha vindo o convite, como fruto do trabalho de duas décadas nesta área.

Quando começa e como serão os trabalhos?

A primeira reunião já e na sexta-feira que vem, dia 5 de junho. As reuniões serão quinzenais, a distância, virtuais neste primeiro momento. Terá um trabalho de preparação para essas reuniões, de leituras, de revisão de documentos e de material, e aí discussão durante essas reuniões. No futuro, à medida que essa situação se restabeleça em relação ao distanciamento social e às restrições de viagem, quando for possível viajar haverá reuniões periódicas em Genebra (Suíça), na sede da Organização Mundial da Saúde. O comitê foi instituído por um período inicial de pouco mais de um ano e meio, até dezembro de 2021, podendo ser estendido à medida que os trabalhos avancem.

Como esse grupo é composto?

Os comitês específicos para cada vacina, em geral, são compostos entre 10 a 15 membros. Eles têm uma representatividade regional e de gênero. Busca-se um equilíbrio de representantes das várias regiões do mundo.

Tem alguma expectativa para uma vacina ainda este ano?

Nós ainda não começamos os trabalhos. As informações que eu tenho são informações gerais das pesquisas que estão em andamento e que são divulgadas. Nosso trabalho de fato vai ser avaliar todos esses resultados, sugerir novos estudos e, em função desses dados e evidências, fazer recomendações no sentido de novos passos e pesquisas adicionais. Quando se tiver evidências de ensaios clínicos em humanos, em relação à segurança e eficácia, o grupo também vai trabalhar no sentido de recomendar e propor estratégias para a vacinação contra a Covid nos países como um todo.

Pelo que você tem acompanhado, o que é possível prever?

Em relação às vacinas atuais, que estão em desenvolvimento, existem inúmeras vacinas candidatas. A gente chama de vacina candidata porque, em geral, se desenvolve uma molécula que tem o potencial de ser um imunógeno, que desenvolva a resposta imune, e essa molécula é avaliada in vitro. Avaliada em laboratórios, depois em animais, o que a gente chama de estudos pré-clínicos. Só depois de passadas essas etapas, as moléculas que são testadas e têm um resultado positivo vão para a próxima etapa, que são os estudos clínicos. Atualmente existem mais de 50 estudos pré-clínicos que estão em andamento, o que é muito positivo. Uma resposta muito rápida, uma colaboração e uma coordenação de estudos internacionais, se a gente pensar que é um vírus novo, que tem menos de seis meses. Estudos clínicos também temos alguns em andamento, em fase inicial que avaliam a segurança da vacina em humanos. As perspectivas são positivas, mas são muitas etapas que têm de ser cumpridas. E isso leva tempo para se fazer, para se ter de fato a garantia de segurança e eficácia. Feito isso e seguidas todas essas etapas, tem toda a parte de preparação industrial de produção, em escala. A gente está falando de uma demanda muito grande. É um processo complexo, que geralmente é bastante demorado. É claro que a gente tem esperança e, de fato, vai ser mais rápido agora com a vacina contra a Covid, mas, menos de oito, dez meses, não deve acontecer de se ter de fato uma vacina pronta para uso no mundo inteiro. Mas a gente tem sim uma expectativa de que haja sucesso nessa empreitada com uma possível vacina há médio prazo, talvez até o final do ano, início do ano que vem.

Será possível uma vacina única para ser aplicada no mundo todo? Ou será como a vacina contra a gripe, com variações?

O vírus da gripe (influenza) é um vírus diferente no sentido de que ele tem uma variação do Hemisfério Norte para o Hemisfério Sul, em relação aos períodos de circulação dele, e também uma mutação viral periódica, de ano a ano. O coronavírus relacionado a Covid, o Sars-CoV2, é um pouco mais estável. Ele tem mutações, mas ele sofre menos essa variação gerando subtipos diferentes, como acontece com a influenza. A perspectiva é de que sim, poderia ter uma vacina que funcione para o mundo inteiro. É nesse sentido que a gente provavelmente vai caminhar.

O vírus que está circulando no Brasil é o mesmo que apareceu na China ou houve variação?

Os vírus sempre têm uma variaçãozinha pequena. Quando se faz o sequenciamento genético, a sequência do DNA mostra quais são as mutações. Tem alterações, mas são muito pequenas, não o suficiente para exigir uma vacina diferente, por sorte.

Fonte: O Popular
Jornalismo Portal Panorama
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