Mudanças nos processos seletivos da União vão entrar em vigor em 2028. Mas professores de cursos preparatórios se preocupam com segurança digital e isonomia entre candidatos

As bancas organizadoras de concurso já se preparam para atender à nova lei que vai unificar as regras de seleções federais. Segundo o texto sancionado recentemente pelo presidente Lula, as provas poderão ser aplicadas total ou parcialmente à distância, usando plataformas eletrônicas controladas. As mudanças ainda precisam de regulamentação, pois os exames on-line somente serão realizados se houver garantia da igualdade de acesso a todos os candidatos.

A nova Lei 14.965/2024 entrará em vigor no dia 1º de janeiro de 2028, após um período de transição, mas poderá ser antecipada.

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Bancas organizadoras como Fundação Cesgranrio, FGV Conhecimento e Instituto Brasileiro de Apoio e Desenvolvimento (Ibade) informam que já tem tecnologia para atender à demanda do governo federal de aplicar provas on-line. Com a regulamentação, alguns ajustes, dizem as instituições, poderão ser necessários para a unificação das normas nos processos seletivos de todo o país, já que a segurança para evitar fraudes e a garantia de oferecer a qualidade de serviço para todos os inscritos, com isonomia, são uma preocupação comum.

Antes de a mudança ser implementada, no entanto, o Ministério da Gestão e da Inovação em Serviços Públicos informa que ainda fará estudos sobre as medidas.

‘”Esse é um processo ainda a ser implementado, pois depende de regulamentação específica, após consulta pública. O Ministério da Gestão ainda irá realizar estudos sobre como essa modalidade pode ser utilizada de forma a garantir segurança, isonomia e a participação de todos os interessados”, informou em nota.

Tecnologia adaptada

As organizações já oferecem o serviço e podem adaptar a tecnologia da qual dispõem às especificações determinadas por cada edital.

A Fundação Cesgranrio, por exemplo, já aplica provas digitais para concursos públicos com o uso de tecnologias avançadas que garantam a segurança e a confiabilidade das avaliações.

— A Cesgranrio utiliza tecnologias que permitem a aplicação de provas tanto em ambientes físicos coletivos homologados, quanto em ambientes individuais, como as casas dos participantes. No entanto, a decisão de permitir que o candidato realize a prova em casa ou em locais específicos dependerá das exigências de cada concurso público, pois diferentes órgãos podem optar por ambientes controlados para garantir maior segurança — disse Carlos Henrique Nogueira, superintendente de Tecnologia e Inovação da Cesgranrio.

Como é feito o monitoramento

Segundo ele, todo o monitoramento da prova é feito por vídeo e áudio:

— Os candidatos são observados por câmeras durante a realização das provas, e seus ambientes podem ser auditados para garantir que não haja interferências externas ou uso de materiais não autorizados. Algoritmos de inteligência artificial são empregados para analisar o comportamento dos candidatos, detectar padrões suspeitos e alertar sobre possíveis tentativas de fraude, como mudanças súbitas de comportamento, olhares frequentes para fora da tela ou a presença de ruídos e conversas.

Ainda de acordo com ele, a Cesgranrio tem tecnologias que restringem o acesso a outros recursos no computador do candidato, como o bloqueio de outros programas e sites.

Além disso, o ambiente do candidato pode ser verificado antes e durante a prova para garantir que não haja materiais não permitidos. A autenticação da identidade do candidato também pode ser feita por meio de reconhecimento facial, verificação de documento de identidade digital e outros métodos hoje disponíveis.

Tecnologia usada desde 2019

A FGV Conhecimento também conta com tecnologia para aplicar provas de forma remota em concursos e em cursos on-line desde 2019. Segundo Carlos Augusto Costa, diretor adjunto da instituição, o candidato recebe orientações para fazer o download do software que será usado para o exame.

— Ao acessar o sistema, a FGV passa a controlar de forma remota o computador de quem baixou o software e bloqueia todos os demais programas, impedindo que o candidato possa interagir com outros sistemas. Com isso, é feito o monitoramento de todos os participantes, que devem ficar com a câmera ligada o tempo todo.

A FGV Conhecimento também tem laboratórios de informática em todo o país e tablets que podem ser liberados, caso os candidatos necessitem.

Seleções com etapas já realizadas de forma on-line

Desde o início do ano, o Instituto Brasileiro de Apoio e Desenvolvimento (Ibade) vem realizando algumas etapas de concursos públicos de forma on-line, como nos casos das seleções da Secretaria de Planejamento, Gestão e Transformação Digital e da Secretaria de Saúde de Recife (PE).

— Sabíamos da implementação da lei publicada recentemente, e já estávamos em reunião com algumas plataformas que poderiam oferecer esse serviço. Ficamos positivamente surpresos com o avanço da tecnologia, porque nossas maiores preocupações eram quanto a sigilo e confiabilidade desses processos realizados via internet — disse Rafael Miranda, supervisor comercial do setor de Relações Institucionais do Ibade.

Ele também destacou o uso da tecnologia no concurso de Pernambuco:

— Neste concurso de Recife, havia uma etapa com um curso de formação com duração de 36 horas. Quando convocado para essa fase, o candidato realizava um cadastro no site, com e-mail e CPF. Automaticamente, o sistema gerava uma senha. No momento do curso, a plataforma trazia novas questões de segurança para que o candidato tivesse acesso e, assim, começasse a assistir ao curso em contato direto com o corpo docente ao vivo, por webcam.

Mais de uma década de experiência

Cláudia Griboski, diretora executiva do Centro Brasileiro de Pesquisa em Avaliação e Seleção e de Promoção de Eventos (Cebraspe), diz que a instituição aplica provas on-line desde 2010. A primeira foi para proficiência em Espanhol. Em 2012, houve exames à distância para 12 cursos do Senai. Hoje, são mais de 40 cursos com avaliações via internet. Mas ela cita os desafios de utilizar o sistema digital:

— São inúmeros desafios, como a adaptação de configurações, acessos prévios para ambientação da plataforma e definições de segurança, além da necessidade de um rigoroso monitoramento de aplicação.

Ouro desafio, diz ela, é a desigualdade de acesso à internet no Brasil:

—Aplicar provas de forma isonômica e tornar equânime as condições de um candidato que está utilizando um celular com 3G de internet ou do que está em sua casa com ar-condicionado em um ambiente tranquilo e silencioso com um computador de última geração e uma internet de alta performance são temas que precisam ser debatidos.

O que dizem os professores de cursos preparatórios para concursos

Os professores de cursos preparatórios veem com desconfiança o uso da internet para aplicação de provas on-line, pois se preocupam com a isonomia dos candidatos, garantindo que os critérios de classificação sejam avaliados de forma correta e igualitária.

— Todo projeto tem pontos positivos e negativos. Eu, particularmente, acho que tem mais pontos negativos. Se na prova presencial já ocorrem tentativas de fraude ou de candidatos que tentam levar cola, imagine se for on-line? Isso sem falar das pessoas que não têm contato com computadores. Como realizarão a prova? — questiona Moisés Romano, da Degrau Cultural, professor de Informática, analista de sistema e gestor em tecnologia.

Ele completa:

— Não podemos deixar de lado o fator de conexão com a internet. Imagine se no momento exato da prova faltar conexão levando à indisponibilidade da prova?

Para Romano, a regulamentação da proposta deverá ser muito bem amarrada para garantir todos os princípios básicos da segurança da informação. Ele, porém, reconhece que existe criptografia para garantir a codificação dos dados e também a assinatura digital para prover a autenticidade da identidade do candidato:

— Ao meu ver, pode até dar certo em concursos mais específicos, como os de juízes, promotores e defensores. Em outros concursos, não creio.

Ele ainda destaca a necessidade de o candidato ter familiaridade com mouse e teclado:

— Pense naquele candidato com pouco ou nenhum contato com teclado ou mouse. O tempo de marcação de questões será diferente dos outros, e isso será mais grave se houver redação, pois além da velocidade de digitar, a pessoa deverá saber como a tecla “shift” deve ser usada para acentos e outras funcionalidades. Sem contar que ela deverá ter conhecimento de navegação na internet, pois essa prova certamente será feita em uma plataforma própria.

O professor Eduardo Cambuy, do Gran Concursos, levanta dúvidas sobre como será garantida a isonomia e a segurança das provas on-line:

— Ainda não se sabe como vai ser. Ainda não foi definido se o processo será totalmente on-line, com tempo rápido para resposta para evitar fraudes, ou se o candidato terá que ir para um local específico.

Ele afirma que questões como qualidade de internet, velocidade de download e computadores para quem necessitar deverão ser amplamente discutidas:

— A mudança deve ser amplamente discutida para garantir a todos os candidatos o mesmo padrão de qualidade digital, o mesmo recurso tecnológico.

Por Martha Monteiro
Foto: Divulgação
Jornalismo Portal Pn7

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