21 de novembro de 2024

A diminuição do desejo sexual, conhecida como perda de libido, é um problema comum — de acordo com o NHS (National Health Service, o sistema de saúde público do Reino Unido), o problema afeta até 1 em cada 5 homens e um número ainda maior de mulheres em algum momento de suas vidas.

O quadro é multifatorial e nem sempre significa algo grave — pode estar relacionado a fatores como estresse profissional ou pessoal, assim como a fases específicas da vida, como gravidez, parto ou amamentação.

No entanto, quando uma perda inesperada e persistente da libido ocorre, vale investigar os motivos que podem estar por trás.

“O primeiro passo é diferenciar o que é realmente perda de libido”, explica a psiquiatra Catarina de Moraes, coordenadora do ambulatório de sexualidade no Hospital das Clínicas de Recife e secretária da Associação Brasileira de Medicina Sexual.

“Por vezes, a falta de libido é confundida com dificuldade de ereção, desempenho sexual ou satisfação — mas ela é exclusivamente a ausência de desejo sexual.”

Segundo o endocrinologista Diego Fonseca, os critérios diagnósticos descrevem que o sintoma deve persistir por pelo menos seis meses para ser considerado clinicamente relevante.

“No entanto, na prática clínica, a avaliação pode ser menos rigorosa, e é importante considerar a situação individual de cada paciente”, diz ele, que atualmente trabalha no Hospital da Mulher Mariska Ribeiro.

Com a ajuda de especialistas, listamos abaixo alguns fatores que podem estar por trás da alteração no desejo sexual.

Mudanças na rotina e fases da vida

Uma redução da libido pode acontecer por motivos simples que todos experimentam em algum momento, como estresse, cansaço, mudanças na rotina e períodos em que outras atividades tomam o tempo que geralmente seria dedicado à atividade sexual — como o cuidado com filhos, por exemplo.

“Isso não significa necessariamente um transtorno. Também é comum que com o tempo em relacionamentos monogâmicos ocorra uma redução do desejo espontâneo (independentemente de contato sexual), embora o desejo responsivo (excitação que surge com estímulos) ainda esteja presente. Desde que haja satisfação sexual, essa redução não é necessariamente patológica”, diz Catarina de Moraes.

Transtornos psiquiátricos

Transtornos psiquiátricos, como depressão e ansiedade podem afetar significativamente o desejo sexual.

“Pacientes com depressão podem experimentar uma diminuição do desejo devido a desequilíbrios químicos no cérebro, incluindo alterações nos hormônios serotonina e dopamina, ligados ao humor e sensação de recompensa e prazer. Nestes casos, o tratamento do quadro pode melhorar o desejo, e consequentemente, a função sexual”, explica a psiquiatra.

Por outro lado, algumas classes de medicamentos usados para tratar depressão e ansiedade têm como efeito colateral justamente a redução da libido.

No entanto, existem opções de tratamento e estratégias – que devem sempre ser indicadas por um profissional da saúde – para minimizar esses efeitos, como trocar o medicamento, reduzir a dose, ou apostar em exercícios comportamentais.

A especialista adverte que os pacientes não devem abandonar o tratamento de depressão se notarem o sintoma, pois a depressão não tratada também pode prejudicar a função sexual – e retirar os medicamentos psiquiátricos abruptamente implica em riscos importantes.

“É fundamental que os pacientes comuniquem abertamente qualquer preocupação relacionada à sua função sexual aos seus médicos.”

Mudanças hormonais

Já se o paciente não apresenta transtornos psiquiátricos ou mudanças de rotina que justifiquem a queda na libido, o próximo passo é investigar mudanças hormonais.

O estrogênio em mulheres e a testosterona em homens são os principais reguladores da libido e atividade sexual, explica Caroline Castro, endocrinologista do Hospital São Camilo.

O estrogênio está associado à saúde dos tecidos genitais, à lubrificação vaginal e ao bem-estar emocional. Já a testosterona está ligada à produção de esperma, à saúde dos tecidos genitais e ao desejo sexual. Ela afeta a disposição mental, aumentando o interesse e a motivação para o sexo.

O diagnóstico nesses casos, pode ser desafiador, diz Diego Fonseca.

“Em homens, por exemplo, não avaliamos apenas se o nível de testosterona está baixo, mas também examinamos o histórico clínico, para checar se outras condições subjacentes podem estar por trás da mudança hormonal.”

Os médicos também apontam quadros como gravidez, pós-parto, amamentação e obesidade — além de outros que também mudam os níveis dos hormônios, como possíveis causas.

“Para esses pacientes, à abordagem pode ou não ser com medicamentos e incluir aconselhamento e orientação sobre as mudanças naturais no corpo. A avaliação deve ser cuidadosa e individualizada, considerando o contexto da vida e da saúde da pessoa”, diz a endocrinologista Caroline Castro.

Comorbidades

O terceiro fator entre os mais comuns citados pelos médicos é a presença de comorbidades que — diretamente ou indiretamente — afetam a libido. Alguns exemplos, são:

  • Condições neurológicas como esclerose múltipla, doença de Parkinson, lesões na medula espinhal ou neuropatia periférica também podem prejudicar a função dos nervos que controlam a resposta sexual, resultando em dificuldades em atingir ou manter a ereção, alcançar o orgasmo ou experimentar a excitação sexual.
  • O diabetes, ao causar alterações hormonais, também pode resultar na diminuição do desejo. Além disso, o quadro causa fadiga e neuropatia, uma condição em que os nervos são danificados. Isso pode levar à perda de sensibilidade e ao comprometimento da função sexual, afetando indiretamente a libido.
  • Pessoas com problemas cardíacos, como insuficiência cardíaca, podem experimentar fadiga crônica devido à redução da capacidade do coração de bombear sangue de forma eficaz. Essa fadiga constante pode diminuir o desejo sexual. Além disso, alguns medicamentos usados para tratar doenças cardíacas podem ter efeitos colaterais que afetam o interesse sexual.

Tratamento e comunicação

Os médicos ouvidos para a reportagem ressaltam que não há uma solução única ou mágica para a queda de libido. Como cada caso é único e o tratamento depende de uma abordagem personalizada, considerando as causas subjacentes e necessidades individuais do paciente.

Um conselho em comum dado pelos especialistas é, no caso dos casais, conversar com o parceiro ou parceira independente da causa da queda de libido.

“É fundamental ter um diálogo aberto e sincero sobre essa questão, apesar de ser um assunto que pode causar desconforto. Falar sobre a diminuição da libido ajuda a evitar mal-entendidos e permite que ambos os parceiros compreendam a situação e busquem soluções juntos”, diz Diego Fonseca.

Por Giulia Granchi
Foto: GETTY IMAGES
Jornalismo Portal Panorama
panorama.not.br

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