Os pedidos de recuperação judicial feitos pelos produtores rurais disparou no ano passado em Goiás e em todo Brasil. Um levantamento feito pela Serasa Experian mostrou que os proprietários rurais que atuam como pessoas físicas fizeram 80 solicitações de reorganização entre janeiro e setembro de 2023, contra 20 em todo ano de 2022, uma alta de 300%. Goiás foi o segundo estado com mais pedidos: foram 25, contra nenhum em 2022.
Entre os motivos apontados para o problema, está o alto nível de endividamento, além de perdas nas lavouras. Uma alteração na Lei de Falências e Recuperação Judicial, em dezembro de 2020 possibilitou que os produtores rurais sejam as únicas pessoas físicas que possam usar este recurso. Segundo o head de agronegócio da Serasa Experian, Marcelo Pimenta, estes produtores já apresentavam um perfil de crédito mais arriscado e que veio piorando com o passar do tempo. “A alteração na lei veio auxiliar o agro a se reestruturar financeiramente, fazer com que esses produtores voltem a produzir e continuem fomentando a economia do país”, acredita.
O levantamento também mostrou que os produtores rurais que mais solicitaram recuperação judicial foram aqueles que tinham maiores áreas com plantio de soja, via análises de sensoriamento remoto. Em segundo lugar vieram aqueles que possuem áreas de pastagem e, depois, de café.
Ao longo do tempo, os grandes proprietários rurais foram os que mais acumularam pedidos de recuperação judicial. Mas Pimenta afirma que, em 2023, isso mudou e parcela da população agro “sem registro de cadastro rural”, que engloba arrendatários de terras e grupos econômicos ou familiares relacionados ao setor, foi aquela que mais solicitou recuperação judicial.colheita
Essa é uma categoria que já trabalha com margens de rentabilidade menores porque, além de todos os custos de sua produção, ainda são onerados com a despesa do arrendamento (aluguel) da terra em que operam. “Além disso, outro estudo recente que fizemos mostrou que os níveis de inadimplência também se mostravam altos para esse grupo. Em um cenário econômico frágil, fica mais difícil organizar as finanças e a recuperação judicial pode ser um caminho para tentar voltar aos trilhos”, explica o executivo da Serasa.
O advogado Leandro Marmo, professor da pós-graduação em Direito do Agronegócio na PUC-PR, diz que estes dados referem-se a 2023 e ainda não estão tão relacionados ao fenômeno El Niño, que será mais sentido em 2024. Para ele, um dos principais motivos é o endividamento alto, pois os produtores frequentemente dependem de financiamento para operar suas fazendas. “Se eles não conseguem pagar esses empréstimos devido a problemas como preços baixos das commodities, podem acabar acumulando dívidas significativas”, destaca.
Flutuações
Outro fator são as flutuações de preços, que podem impactar diretamente a lucratividade das atividades agrícolas. Em 2020, após pandemia, houve aumento expressivo no valor das commodities e da margem de lucro, o que incentivou o produtor a investir na produção, comprando ou arrendando mais terras e adquirindo insumos e maquinários, o que exigiu mais empréstimos. “Ele assumiu compromissos financeiros com base nesta grande margem de lucro. Geralmente, são empréstimos pagos ao longo de vários anos, lembra o professor.
Mas, nos últimos três anos, houve aumento muito expressivo no custo de produção e, de 2022 para cá, queda expressiva nas cotações agrícolas e na margem de lucro. Com a alta dos custos e a queda no valor das commodities, essa capacidade de pagamento foi muito reduzida e ele não teve mais condições de honrar os compromissos feitos. “Além disso, eventos climáticos extremos, como secas, enchentes ou geadas, podem destruir colheitas e derrubar a produtividade, o que está sendo agravado pelo El Niño”, explica Marmo.
Mato Grosso foi o que registrou a maior quantidade de requisições de recuperação judicial, tanto em 2023 como em 2022. Goiás ocupa a segunda posição. Para o professor, a recuperação judicial pode ser uma ótima solução, pois oferece benefícios como desconto de 20% sobre até 90% do total das dívidas, carência de dois anos para o início das parcelas e prazo médio de 10 anos para pagamento das dívidas parceladas.
Marmo diz que um terço dos produtores estão negativados e outros 33% estão ‘com a corda no pescoço’ prorrogando suas dívidas. “O cenário é muito desafiador e, para 2024, será bem mais grave, com os efeitos do El Niño e a queda na produtividade, pois o custo ainda está alto, e os preços, baixos”, adverte. Com a estimativa de R$ 24,3 bilhões em perdas de produtividade, a expectativa é que a procura pela RJ continue aumentando. “O número ainda é muito baixo e não chega nem a 1% dos que poderiam pedir”, completa.
Fonte: O Popular
Foto: Diomício Gomes
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