“Quantas vezes um homem precisa olhar para cima antes que ele consiga ver o céu?
E quantos ouvidos alguém precisa ter até que consiga ver as pessoas chorando?
Quantas balas de canhão precisam voar até serem para sempre banidas?
A resposta, meu amigo, está soprada ao vento…” (Bob Dylan)
O mundo das letras ficou perplexo neste outubro/2016 ao tomar conhecimento que um representante do universo musical – Bob Dylan – havia recebido o prêmio máximo da literatura. Os protestos foram imediatos. A justificativa da Academia Sueca foi lacônica (lacônica é mais ou menos o mesmo que “curta e grossa”): “Novas expressões poéticas dentro da tradição de canções americanas.”
As manifestações contrárias já eram aguardadas. Afinal, tinha gente na fila esperando o prêmio já há algum tempo. “A Academia Sueca ridiculariza-se”, protestou um escritor francês. “Lamentável.” – “Um desastre para as livrarias”, contabilizou outro.
A Academia voltou a justificar-se por meio de sua porta-voz: “Ele vem se reinventando, criando novas identidades…”- “Ele” é o próprio – Robert Allan Zimmerman, conhecido como Bob Dylan, considerado o segundo num ranking encabeçado pelos Beatles. Versátil: compositor, ator, pintor e até… escritor! Sobressaiu-se na música. Mas música ligada à poesia. Afinal, na tradição clássica de Homero e Safo, música e poesia estavam interligadas. Basta recitar e cantar, como, aliás, fizeram as gerações de um passado remoto, antes do livro. Conclui-se então que a arte da palavra não depende de um volume de páginas impressas…
É verdade: foi um prêmio, não a um escritor, mas a um trovador. Brincar com a linguagem, explorar recursos da palavra, suscitar emoções é literatura. Tudo isso Bob Dylan faz com competência há cinquenta anos! Mais de 500 canções com textos sublimes, letras fortes e memoráveis.
Polêmicas corporativas à parte, podem-se avaliar alguns efeitos colaterais positivos a partir dessa premiação: afinal, só faz literatura quem escreve livros?
“Me alegro que se reconheça também a literatura da palavra no seu sentido poético, numa época em que muitos artistas pensam ser dispensados de fundo e forma em sua criação”, defende o poeta Alan Mabanckou. “E quando palavras e sons se harmonizam, o resultado é uma força poética maior”, acrescenta.
Quem sabe, a partir de agora, vamos chamar nossos Caetano, Gil, Chico e outros como Cazuza e Renato Russo de poetas? – Quem sabe vamos avaliar melhor todo o lixo televisivo despejado em nossas casas nas tardes de domingo?
Enfim, quantos prêmios desse tipo ainda serão necessários para se entender que a palavra, em forma poética, é literatura? -Quer a resposta?
“The answer, my friend, is blowin in the wind” – (Bob Dylan)
Colunista: Prof: Jorge Pita
Revisão: Rosana de Carvalho
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