A pandemia causada pelo coronavírus fez com que milhares de brasileiros e empresas acumulassem dívidas. Aproximadamente 62,5 milhões de pessoas estão com contas em atraso no país, com um déficit médio de R$ 3.934,38 por endividado, segundo dados da empresa Serasa Experian.
Além de pessoas físicas, as micro e pequenas empresas também sofreram com a pandemia. Elas representaram 92,9% do total de negócios com contas atrasadas em dezembro de 2020, sendo considerados os negócios com mais dívidas em aberto no país. “As pequenas e médias empresas foram muito afetadas pela pandemia e pós pandemia. Estão tendo dificuldade enorme de retomada econômica”, afirma João Esposito, economista e CEO do escritório de contabilidade Express CTB.
Analistas apontam que a organização e a renegociação de dívidas com instituições financeiras podem ser boas soluções para aqueles que precisam reequilibrar suas contas e sair do vermelho.
Antes de fazer um empréstimo
Para evitar que renegociações se tornem uma dor de cabeça, a professora da Fundação Getúlio Vargas (FGV) e planejadora financeira Myrian Lund aponta para a necessidade de negociar a taxa de juros e outras condições do contrato antes de pegar um empréstimo.
“É preciso fazer a lição de casa: informar ao banco por que está fazendo um empréstimo, como e quanto pode pagar. Também é preciso pedir com antecedência e levar a negociação para um comitê de empréstimo – grupo que analisa a concessão de crédito dentro de um banco -, que pode baixar ainda mais a taxa de juros”, completa.
Já está com dívidas? Evite dor de cabeça
Caso já tenha feito mais de uma dívida, a dica é priorizar qual pagar primeiro. De acordo com o economista João Esposito, é necessário avaliar quais dívidas precisam ser pagas antes das outras, considerando os juros mais altos e o risco de problemas com a Justiça.
“Para empresas, por exemplo, a dívida com funcionários tem que ser a primeira a ser resolvida, senão a empresa nem funciona. Depois dívidas com fornecedores, credores e com o governo”, declara.
Para pessoas físicas, é necessário identificar as dívidas mais importantes -como crédito consignado e financiamento imobiliário-, e rever os ganhos e as despesas da família.
“Não se deve tomar nenhuma decisão sem antes analisar o fluxo de caixa, o que se recebe e o que paga. Isso possibilita ver o que se pode reduzir: internet, TV a cabo, celular, conta de luz”, declara Myrian Lund.
Ainda segundo a professora, após a diminuição dos gastos fixos, é necessário ver qual o valor das dívidas fixas, como crédito consignado – aquele que é descontado diretamente da folha salarial – e financiamento imobiliário. Só então é possível saber qual é o valor que sobra para os outros gastos variáveis, inclusive para pagar outras dívidas.
Como renegociar as dívidas?
Para renegociar, é importante procurar a instituição financeira e tentar o melhor acordo possível para pagamento.
Dados do contrato como prazo, carência, desconto na multa e nos juros podem ser discutidos. Além disso, há sempre a possibilidade de mudar de banco, caso outro ofereça taxas melhores.
Uma nova ferramenta do Banco Central pode facilitar a oferta de crédito para empreendedores e pessoas físicas. De acordo com o economista João Esposito, o open banking -compartilhamento de dados bancários pessoais- vai possibilitar que os bancos conheçam mais o perfil do cliente, melhorando o ambiente de competição e de oferta de crédito.
O que fazer se não houver acordo
Se não houver sucesso nas negociações com os bancos, analistas apontam para a possibilidade de recorrer à Justiça. Para isso, o Código de Defesa do Consumidor e o Código Civil podem ser fortes aliados dos devedores.
A lei 14.181, aprovada em julho pelo Congresso Nacional, modifica partes do Código de Defesa do Consumidor, pode facilitar a negociação de dívidas e evitar o aumento da inadimplência.
Embora a lei trate do superendividamento de consumidores, uma nota técnica publicada pela Secretaria Nacional do Consumidor (Senacon) afirma que o microempreendedor que ganha até R$ 60 mil por ano (açougueiro, cabeleireiro, sapateiro, entre outros) também se enquadra como consumidor vulnerável integrante do CDC.
“Pela lei do superendividamento, somente pessoa física pode ser beneficiada com a negociação. Mas é possível uma tese que envolva microempresários individuais, dependendo do caso”, afirma Marié Lima Alves de Miranda, presidente da Comissão Especial de Defesa do Consumidor da OAB Nacional.
Pandemia permite mais negociação
Além disso, está previsto no Código Civil que há a possibilidade de renegociações no período da pandemia, que é um momento crítico para o país.
“Tempos de força maior e de adversidades incontroláveis, por ambas as partes, geram ensejo para que os valores sejam revistos e as condições alteradas”, afirma Esposito.
Para Marié, o mercado de crédito precisa se conscientizar sobre a necessidade de fornecer produtos de forma a cooperar com a recuperação econômica.
“A lei vem favorecer os superendividados. Não veio só para proteger o consumidor, mas a própria economia do país, que é uma preocupação nossa”, diz.
Por Carolina Pulice
Foto: Getty Images/iStockphoto/Doucefleur
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