Uma pesquisa inédita conduzida pela empresa Gattaz Health & Results, liderada pelo presidente do Conselho Diretor do Instituto de Psiquiatria da Universidade de São Paulo (IPq – USP), Wagner Gattaz, mostra que 18% dos profissionais brasileiros, 1 a cada 5, sofrem com a síndrome do burnout. Além disso, 43% relataram sintomas depressivos, com 13% tendo sido diagnosticados com a doença; e 24%, queixas relacionadas à ansiedade, embora apenas 5% oficialmente com o diagnóstico para o transtorno.
O levantamento foi apresentado durante o Congresso Brasileiro de Psiquiatria, no início de outubro em Fortaleza, Ceará. O trabalho teve início em 2015 e nos últimos sete anos contou com o auxílio de uma inteligência artificial para identificar funcionários de grandes empresas brasileiras e enviar a eles um questionário sobre os aspectos de saúde mental.
Até agora, foram contactados 86,5 mil profissionais, com 38,1 mil respondendo às perguntas. A maioria dos entrevistados eram mulheres e, além dos resultados referentes ao burnout, à depressão e à ansiedade, a pesquisa identificou que 9% relataram problemas com álcool. O professor explica que o objetivo é dar continuidade nos próximos anos ao levantamento para incluir um número cada vez maior de trabalhadores brasileiros.
– Nós já aumentamos e estamos com mais de 100 mil envios dos questionários. Quanto maior, mais você pode fazer subgrupos. Isso é importante, estudar por áreas, por ramos de trabalho, porque a prevalência (de burnout) entre um funcionário de TI (Tecnologia da Informação) é diferente da de um mecânico, por exemplo. É importante termos esses perfis porque eles orientam os programas de prevenção, saber quais áreas têm mais incidência. Geralmente, os profissionais que lidam com o público são os que têm maiores taxas, por exemplo, os bancários, os funcionários de call centers – afirma o pesquisador.
Gattaz explica que a síndrome do burnout, incluída na Classificação Internacional de Doenças da Organização Mundial da Saúde (OMS) em 2019, afeta três dimensões. A primeira é relacionada à falta de energia, a um cansaço excessivo. Em seguida, passa a ocorrer a fase chamada de despersonalização, em que o profissional sofre uma instabilidade emocional. Por fim, há como consequência um estado contínuo de insatisfação com o trabalho.
Os principais fatores de risco para o quadro são situações de comunicação deficiente, como falta de feedback adequado; baixa autonomia do funcionário; baixo apoio social, como conflitos entre chefes e colegas; um número elevado de demandas e uma pressão relacionada ao tempo, por exemplo, com o simultâneo aumento das responsabilidades.
A pressão por produzir mais em menos tempo é um dos principais fatores que ajudam a desencadear o burnout, de acordo com estudos. Já combater os casos da síndrome, com programas de saúde mental em empresas e acompanhamento psicoterápico, pode não apenas melhorar a qualidade de vida dos funcionários, como oferecer um retorno econômico positivo para a corporação, defende Gattaz.
Uma comissão da revista científica The Lancet, composta por 28 especialistas internacionais em psiquiatria, neurociência e saúde pública, chegou a estimar o gasto mundial de 16 trilhões de dólares até 2030 no tratamento de problemas de saúde mental.
Por outro lado, um estudo da Organização Mundial da Saúde (OMS), publicado na The Lancet Psychiatry, mostra que cada dólar investido no tratamento dos diagnósticos psiquiátricos é revertido em quatro dólares de retorno. Isso porque reduz, por exemplo, dispensas do trabalho, cenários de baixa produtividade e aumenta o número de indivíduos empregados e, portanto, colaborando com impostos.
– O cenário no Brasil é bastante parecido com o dos demais países, inclusive o aumento visto com a pandemia. A parte boa é que a Covid-19 trouxe uma atenção maior das empresas para programas de saúde mental, elas estão vendo como eles são importantes. Nós (profissionais da saúde) somos chamados hoje por empresas que em um passado recente nem reconheciam a existência do problema, mas agora veem que investir na saúde mental é um dos fatores principais inclusive para a sustentabilidade do negócio da empresa – conclui Gattaz.
Em relação ao tratamento e à prevenção, além do acompanhamento por médicos especialistas e a redução de fatores de risco, a diminuição de algo chamado de “índice de distância do poder” também é associada a menores taxas de burnout. Esse índice é relacionado à maneira pela qual membros de determinada hierarquia encaram a desigualdade de poder naquela estrutura.
Quando esse indicador é maior, há um distanciamento entre chefes e funcionários, uma sensação de medo imposta pelos superiores e menor acessibilidade a eles, o que foi ligado a mais casos de burnout. Já quando ele é menor, há uma relação melhor entre os profissionais de diferentes níveis da empresa, o que diminuiu os registros da síndrome.
Na palestra, Gattaz também destacou a baixa prevalência de transtornos de ansiedade entre os profissionais registrada na pesquisa, de 5%, menor que a taxa média do Brasil segundo a Organização Mundial da Saúde (OMS), que é acima de 10%. Para ele, uma explicação é que esses indivíduos podem ter mais dificuldade de entrar no mercado de trabalho pelas avaliações feitas durante o processo seletivos pelos profissionais de recursos humanos.
Fonte: Agência O Globo
Foto: Reprodução/Freepik
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