O sistema de distribuição de energia elétrica em Goiás é crítico, com 44% dos transformadores sobrecarregados e mais de 72% das extensões das redes de baixa tensão (equipamento considerado pouco eficiente). O cenário foi descrito pelo goiano Lener Jayme, que assumiu a presidência da Equatorial Goiás, após a transferência de controle societário da Enel Distribuição Goiás para a Equatorial Participações e Investimentos S.A.
Neste contexto, Jayme voltou a destacar a experiência da companhia em melhorar o desempenho de distribuidoras de energia elétrica no Brasil. Segundo ele, a situação em Goiás é pior do que em outros estados em que a empresa atua, como no Pará. Sem divulgar prazos sobre quando o consumidor começará a perceber melhoras no serviço, o presidente afirma que o foco do trabalho está na percepção do cliente.
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Com permissão da Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel), a Equatorial será fiscalizada sem correr risco de receber multas em 2023 e não poderá perder a concessão por três anos.
Do ponto de vista técnico, qual a condição do sistema de distribuição de energia elétrica encontrada pela Equatorial em Goiás?
Nós estudamos muito a concessão antes de entendermos que valia a pena buscar a negociação. Nesses estudos, analisando o data room, e posteriormente in loco, nós constatamos várias oportunidades de melhoria na rede apesar de todos os investimentos prudentes já realizados pela antiga concessionária. Por exemplo, transformadores em sobrecarga. Hoje, aqui em Goiás, nós temos 44% dos transformadores de força sobrecarregados. Isso onera a nossa oferta de energia, faz com que possamos atender menos clientes que demandam por energia em novos pontos. Também dificulta a qualidade no atendimento, porque passamos a ter energia sem condição de estabilidade. Encontramos aqui ainda uma dificuldade que nos leva a imaginar que a gente vai ter muito tempo para sanar o aspecto técnico: redes monofásicas, mais de 72% das extensões das redes de baixa tensão. Em comparação, uma das concessões mais difíceis do país, ditas pela agência reguladora, é no Pará, que tem 60% de redes monofásicas e concentradas. Aqui, nós temos 72% das redes monofásicas e completamente dispersas, distribuídas em todo o estado de Goiás. Outro ponto, muita carga nas pontas. Aqui, o agro é muito forte. Com isso, nós temos muita demanda nas pontas dessas redes monofásicas, que são longas. Isso também é um dificultador grande.
Quais as flexibilizações regulatórias que a Equatorial solicitou à Aneel? Todas foram atendidas?
Sim, todas. A Aneel acompanhou aqui todo o desempenho ao longo dos anos e entende o desafio que é para uma empresa que está chegando no território, que precisa se estabelecer, claro, que de forma ágil, mas tem que enfrentar todos esses desafios, é razoável que se conceda o que foi estabelecido. No primeiro ano, nós vamos ter a fiscalização apenas orientativa. Vai existir, vamos estar sempre prestando contas à Aneel, mas não haverá penalidade nesse primeiro ano. Também foi afastada qualquer possibilidade de risco de caducidade ou de abertura de processo de caducidade para a concessão nos três anos subsequentes. Então, neste período, tanto por questões operacionais e técnicas, quanto por questões financeiras, nós não teremos processo de caducidade.
Por qual motivo a Equatorial entendeu que é importante a flexibilidade desses dois pontos?
Por mais que nós venhamos a fazer aplicações e investimentos na rede, existe um prazo de maturação dos investimentos para trazer a qualidade. Então, ao longo desse período, com os investimentos que serão realizados, certamente nós viremos a ter uma melhoria de percepção de qualidade, mas isso leva tempo. Se nós tivéssemos hoje todo o dinheiro do mundo, nós não teríamos parque fabril disponível, nós não teríamos mão de obra disponível para fazer tudo o que é necessário aqui no primeiro momento. Vamos fazer dentro daquilo que o parque fabril nos concede. Não vai faltar investimentos aqui para contribuir com o crescimento do estado, mas, em contrapartida, nós podemos ter algum risco de abertura de processo de caducidade. Isso (flexibilidade sobre processo de caducidade) é mais uma garantia importante de se ter no contrato, mas não é nada que nos preocupe.
Existe possibilidade de a Equatorial pedir para aumentar o período de fiscalização orientativa?
Não, só 2023.
A Equatorial apresentou um plano de ação à Aneel. O que está previsto neste plano?
Sempre que a Equatorial assume uma nova concessão – lembrando que essa não é a primeira, o Grupo Equatorial vem se expandindo muito desde 2004, nós começamos no Maranhão e, a partir daí, adquirimos concessões no Pará, Amapá, Piauí, Alagoas, Rio Grande do Sul, e também em saneamento -, nós já temos um plano estabelecido para implantar o modelo de gestão do Grupo. Nosso modelo é muito célere e eficiente. Nós precisamos ajustar as pessoas e os procedimentos a esse modelo Equatorial, e isso tudo está concentrado nesse plano de 100 dias. Tem ações comerciais, técnicas, operacionais, jurídicas. É a implementação do modelo Equatorial dentro da concessão que nós assumimos. Esse plano já está praticamente 30% executado. Agora, quando nós adentramos a concessão, efetivamente fazemos alguns ajustes finos, porque agora nós estamos de posse de conhecimento realmente de 100% do que nós encontramos, para que nós possamos concluí-lo dentro dos 100 dias. Para se ter uma ideia, já se foram mais de 2,8 mil ações elencadas para que seja implantado o modelo Equatorial de gestão dentro da nossa concessão. E essas ações vão trazer mais de 350 itens de mudança dentro da empresa.
Quais tipos de ações, por exemplo?
A forma de implementar ajustes contábeis, de contabilização de ativos. Ajustes operacionais, procedimentos de campo, revisão dos contratos, para que eles tenham modelo de operação da Equatorial, processos jurídicos, escritórios com os quais nós vamos trabalhar. Então, todo o arcabouço gerencial, trazendo o modelo de gestão do grupo.
A revisão tarifária extraordinária foi retirada pela Equatorial como condição para concretizar a transferência de controle. Por qual motivo?
Quando estávamos estudando o processo de aquisição, em um primeiro momento, nós entendemos que seria necessária a revisão tarifária especial. Quando levamos isso para agência reguladora, juntamente com os demais itens que nós já citamos, a agência entendeu que não seria o momento. Nós levamos essa atividade para casa e realmente entendemos que não é necessário pleitear agora qualquer revisão tarifária especial. Então, isso não vai acontecer, está sepultado o assunto no momento pelo Grupo Equatorial.
O senador Jorge Kajuru criticou o que chamou de “contrato secreto” em referência à reunião que aprovou a transferência de controle societário da Enel para a Equatorial. Ele diz que falta transparência quanto à operação e o plano de ações e investimentos. Como vê essas críticas e como o senhor responde ao senador?
Acho que não há de se fazer mais resposta. Ele disse que não havia transparência, mas na própria reunião em que ele esteve na agência reguladora foi projetado e publicado todos os dados da transação. Então, não entendo que haja nada que tenha sido feito às escuras, muito pelo contrário, a transparência é uma das nossas principais características.
Antes de assumir a Equatorial em Goiás, o senhor estava na Equatorial Piauí. A situação aqui é diferente da que o senhor encontrou lá? Qual é mais desafiadora?
Eu não estou voltando para Goiás, eu nunca deixei Goiás. Eu comecei aqui na antiga TeleGoiás. Tive a minha vida profissional iniciada aqui na região Centro-Oeste, depois no Brasil, através da TeleGoiás, Oi e Brasil Telecom. Mas a minha família, meus filhos e minha esposa sempre moraram em Goiânia e eu estava aqui presente todo final de semana, inclusive nesse período em que eu estive no Piauí. Com relação aos desafios, é muito diferente, mas não difícil de ser concluído com sucesso. Falando um pouco do histórico da Equatorial, quando nós assumimos no Maranhão, tínhamos uma situação praticamente de calamidade junto aos nossos consumidores. Nesse período, nós melhoramos em 53% o DEC, a duração equivalente de falhas por cliente. No Pará, nós melhoramos 79%. No Piauí, em pouco tempo, nós já melhoramos 22%. Alagoas, idem. Nosso modelo gerencial nos leva a ser bem sucedidos nesse turnaround de empresas que são deficitárias, tanto sob o ponto de vista operacional quanto financeiro. Ninguém quis essas concessões que citamos e o grupo Equatorial entendeu que valia a pena, e comprovou que a situação pode ser revertida em curto espaço de tempo. Da mesma forma, encontramos o estado de Goiás. Como eu comparei Pará com Goiás, eu digo a você que Pará é uma das concessões mais críticas, dita pela própria agência reguladora, e aqui em Goiás nós estamos em uma situação ainda pior, quer seja em relação ao carregamento dos transformadores, quer seja com relação a extensão de redes monofásicas. Então o desafio é grande, mas nós vamos superá-los com os investimentos necessários nos momentos necessários. E de forma muito alinhada com o interesse de crescimento do estado. Essa é a nossa expectativa, é por isso que nós aqui estamos.
A Enel usou reforço de equipes de outros estados para garantir manutenção preventiva e o atendimento de emergência aqui em Goiás. A Equatorial também pretende usar essa estratégia?
No primeiro momento, nós não pretendemos porque entendemos que pode não ser necessário. Se tiver necessidade, sim, nós temos concessões próximas. Piauí, por exemplo, é uma concessão muito próxima. O Sul do Piauí pode nos apoiar ou nós podemos apoiar lá. O grupo Equatorial hoje está no país inteiro, do Oiapoque ao Chuí. Então, claro, havendo uma emergência, uma situação catastrófica, todas as distribuidoras podem trocar recurso e prestar apoio. É muito raro acontecer, acho difícil a gente chegar a um ponto desse. Mas, havendo a necessidade, sim.
A Associação das Empresas do Mercado Imobiliário de Goiás (Ademi-GO) divulgou em 2022 casos de atraso na ligação de energia elétrica em empreendimentos. Houve caso em Goiânia de prédio em que os moradores se mudaram e a empresa responsável precisou colocar geradores de energia para atender os apartamentos. A Equatorial conhece esse problema? Como solucionar?
A nossa evolução de investimentos prevê isso. Sabemos sobre a demanda reprimida. Por isso, exemplifiquei na primeira entrevista coletiva (na terça-feira, dia 3) que nós já temos alguns investimentos direcionados para todos os setores do estado. Exemplifiquei, por exemplo, distritos industriais. A gente precisa dar volume de energia para que o estado se desenvolva. Então, as áreas industriais são muito importantes para nós, tanto o distrito industrial de Aparecida de Goiânia quanto o Distrito Agroindustrial de Anápolis (Daia) já serão contemplados. Também há planos para a região metropolitana de Goiânia, vamos inaugurar esse ano a subestação Riviera, que vai atender praticamente 50 mil clientes na região. Nós estamos, sim, preocupados e, de novo, não vão faltar investimentos para que possamos contribuir com o desenvolvimento do estado de Goiás.
Existe reclamação constante de produtores rurais em relação à distribuição de energia elétrica. Tem algum plano específico para atender esse setor?
Um outro exemplo que eu citei na coletiva é o investimento lá na região de Jataí. Ali nós já estamos beneficiando toda aquela região de Chapadão do Céu, Montividiu, Jataí, que é uma região forte no agronegócio. Então, existe, sim, essa preocupação e é por essa preocupação que nós distribuímos a superintendência de todas as regiões do estado.
Como fica a relação com os fornecedores? O que deve mudar nos novos contratos, para seguir o padrão da Equatorial?
Tem vários fornecedores que aqui estão e já são fornecedores do grupo Equatorial, e, com isso, já conhecem o nosso modelo de trabalho. Alguns contratos estavam vencendo logo após o fechamento do negócio entre Enel e Equatorial. Eles foram prorrogados por três ou seis meses, para dar tempo de haver a transição. Durante esse período de vigência dos contratos e no nosso início de gestão, vamos procurar os fornecedores, ajustar os contratos à realidade do modelo da Equatorial. Cada empresa tem o seu modelo contratual e de implementar as atividades. Então, nós vamos ajustar esses contratos, ajustar os preços. Obviamente, vai ter oportunidade para todo mundo, quer seja para os que já estão prestando serviço ou para os demais, que queiram participar de algum processo seletivo. Não existe aqui restrição de qualquer fornecedor. Ele já estando aqui ou novo fornecedor que oferecer um valor melhor, uma situação técnica melhor, será contemplado.
Em 2021, a Enel Goiás foi a terceira pior distribuidora de energia do país. Em quanto tempo o senhor acredita que o sistema de Goiás deve subir nesse ranking?
Existe uma ambição muito grande de fazer isso rapidamente. A gente precisa tirar um pouco o foco da questão de DEC (Duração Equivalente de Interrupção por Unidade Consumidora) e FEC (Frequência Equivalente de Interrupção por Unidade Consumidora). Não é só um indicador que mede a qualidade do sistema. É preciso notar e trabalhar com a percepção do cliente. Então, na hora em que nós começarmos a ter uma percepção melhor do cliente, você vai ver que, naturalmente, o indicador é consequência. Com essa robustez na ponta, certamente nós vamos tratar de maneira mais ágil as falhas, que ainda vão ocorrer. Infelizmente, a gente não consegue resolver isso da noite para o dia. Nós não estamos aqui vendendo ilusões. Mas certamente nós vamos tratar essas falhas com a velocidade maior.
E tratando com a velocidade maior, nós vamos ter um indicador melhor e a percepção do cliente, também, melhor. Outra coisa que vai trazer a melhoria da percepção do cliente é este relacionamento que eu acabei de mencionar para você. Com um gerente de relacionamento de cliente em cada superintendência, se identificando, se colocando à disposição, estamos visitando rotineiramente os clientes, certamente o nível de satisfação também aumenta e a velocidade de tratamento das falhas também, porque o cliente vai saber quem deve procurar no momento de crise.
Não é possível colocar um prazo?
Não. Existe uma vontade de fazer o mais rápido possível.
O Humberto Eustáquio Tavares Corrêa será o assessor de assuntos institucionais da Equatorial. Já tem reuniões marcadas?
Já houve reuniões. Já estivemos na Fieg (Federação das Indústrias do Estado de Goiás) e temos interesse de agendar reuniões para a próxima semana. E o nosso relacionamento, quer seja com as federações, com as associações, com a Adial (Associação Pró-Desenvolvimento Industrial do Estado de Goiás), é para ser o mais próximo possível. Com o governo do estado, nós vamos fazer também aproximação maior ainda. Queremos que o planejamento de crescimento do estado seja nossa referência para o desenvolvimento, para os nossos investimentos, de forma a garantir o desenvolvimento do estado de Goiás.
A reunião com o governo estadual ainda não aconteceu?
Nós tivemos reuniões com o estado na época da transação. Com o planejamento aberto, não. Mas vai acontecer.
Fonte: O Popular
Foto: Wildes Barbosa / O Popular
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