
Ferimento na mão de trabalhador revela condição degradante e falta do fornecimento de equipamento de proteção (SRT/GO)
Com 37 casos, Goiás é a terceira unidade da federação em número de empregadores que figuram na Lista Suja do Trabalho Escravo. O estado fica atrás apenas de Minas Gerais (112) e São Paulo (44). Pará (36) e Piauí (35) aparecem na sequência.
Nos últimos anos, Goiás tem figurado como o segundo estado em número de pessoas resgatadas de trabalho análogo a escravidão. O ranking costuma ser liderado por Minas Gerais.
A relação é atualizada duas vezes ao ano. A mais recente inclusão foi no último dia 5 e o total de empregadores no Brasil chegou a 472. Foram 204 inclusões, 11 delas de Goiás. O documento refere-se a casos que ocorreram dos anos 2018 a 2023.
Figurar na Lista Suja do Trabalho Escravo implica, além de impacto na imagem, em dificuldade ao crédito. O Banco do Brasil, por exemplo, não fornece empréstimo para empresas que estejam na relação. A instituição financeira pode até mesmo adiantar a cobrança de parcelas de um financiamento concedido anteriormente.
As empresas ficam expostas por 12 meses após a finalização do trâmite administrativo do auto de infração no Ministério do Trabalho e Emprego (MTE). Como figurar na relação pode prejudicar os negócios, os empregadores costumam recorrer e, em alguns casos, acionar a Justiça. Por este motivo, há casos de 2018 na relação divulgada.
Em Goiás, o setor com o maior número de trabalhadores em condições análogas à escravidão é o de cultivo da cana de açúcar, com 161. Só em um dos casos, neste ano, em uma empresa de Acreúna, houve 138 pessoas resgatadas.
Conforme a Superintendência Regional do Trabalho em Goiás (SRT-GO), havia condições precárias, os trabalhadores dormiam no chão e não havia fornecimento de equipamentos de proteção individual de proteção (EPIs) para eles.
No caso em questão, se tratava de três prestadores de serviço que atendiam a Agropecuária Nova Galia LTDA. A empresa autuada afirmou, em nota, ao POPULAR não corroborar com práticas de trabalho escravo. “Todas as diligências exigidas pelo Ministério Público do Trabalho foram devidamente atendidas e o caso está sendo discutido judicialmente.”
Quando é observada a atividade econômica dos infratores, lideram a quantidade de empresas goianas na lista: produção de carvão vegetal – florestas plantadas; extração de basalto e beneficiamento associado; extração de madeira em florestas plantadas; cultivo de soja e serviços domésticos.
Em se tratando das situações de pessoas encontradas em trabalho análogo à escravidão na atividade de produção de carvão vegetal, o relato é de situação degradante.
“São situações precaríssimas: pessoas dormindo em locais sem asseio, sem camas ou quando as têm sem a roupa de cama, sem instalações sanitárias. E as condições de trabalho são bastante precárias. Em alguns casos eles laboram 14/15h por dia, principalmente na função do carbonizador, que é o que queima o carvão. Eles não recebem equipamentos de proteção individual e às vezes têm de providenciar a própria água”, resume o auditor fiscal do trabalho Roberto Mendes.
Caso de trabalho doméstico escravo durou 30 anos
Em relação aos casos de trabalho doméstico, foram três situações em Goiás que resultaram em inclusão. Em relação às localidades Acreúna, São Simão, Nazário e Santa Bárbara aparecem no topo (veja quadro).
Um dos casos de trabalho mais emblemáticos apurados pelo POPULAR ocorreu em Anápolis. Uma criança de 12 anos deixou o Maranhão com a promessa de ser acolhida em uma casa de família. O resgate ocorreu em 2021, quando ela já estava no local havia 30 anos sem receber salário, praticamente em troca da habitação e alimentação. A decisão sobre o auto de infração é de agosto de 2022 e a inclusão na lista do MTE foi realizada em abril deste ano.
A vítima não teve acesso a educação na juventude e foi precariamente alfabetizada. Sem vida social, não tinha amigos e um acordo concedeu a ela uma casa no valor de R$ 150 mil e o pagamento de um salário vitalício. A mulher precisou de assistência social para poder seguir a vida, conforme uma fonte ouvida pelo POPULAR sob a condição de anonimato.
Dois dos 11 empregadores de Goiás incluídos recentemente na relação lidam com a extração da palha do milho. No ano passado, uma das maiores fiscalização ocorreu em um destes estabelecimentos. As condições eram degradantes.
Como denunciar o trabalho escravo
Qualquer pessoa pode fazer uma denúncia de trabalho escravo. O relato pode ser exposto, sem que o denunciante se identifique, por meio do site do MTE. O link é o https://ipe.sit.trabalho.gov.br/#!/. Basta fornecer informações sobre o local do caso e explicar o que acontece. Quanto mais detalhes, mais relevância para o registro, inclusive, podem ser anexados arquivos como fotos.
Qualquer pessoa pode acessar a Lista Suja do Trabalho Escravo. O documento está disponível no site do MTE.
Para acessar a Lista Suja do Trabalho Escravo basta clicar aqui.
Resgates já superam 2022 em 76,7% no estado
Até o momento, foram resgatados em Goiás 479 trabalhadores em situação análoga à escravidão neste ano. O número representa um aumento de 76,7% em relação a todo o ano passado, quando houve 271 registros do tipo.
Os dados deste ano fazem com que praticamente um em cada cinco resgates no País tenha se consolidado no território goiano. Em todo o País, até o momento, foram 2.573.
A alta é vista pelo auditor fiscal do trabalho da SRT-GO, Roberto Mendes, como um sinal de que com a mudança no governo federal, as pessoas estão mais encorajadas a denunciar as práticas abusivas.
Sobre o acréscimo, ele também atribui as mudanças na legislação trabalhista, em 2017. “Em 90% dos casos, verificamos que há a presença da terceirização. Se não fossem as poucas condenações que existem, o número destes casos poderia ser muito maior.”
A fiscalização do trabalho também monitora o tráfico de pessoas para a prática. Goiás aparece, conforme a estatística oficial do MTE como o segundo destino das pessoas aliciadas, atrás apenas de Minas Gerais.
Fonte: O Popular
Foto: SRT/GO
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